quinta-feira, 29 de setembro de 2011

a mais verdadeira

Especialmente quando conto histórias que parecem mentira;
quando exagero sentimentos;
quando canto alto, quando te abraço repentinamente;
quando repito teu nome - quando sorrio ao repetir teu nome.

Eu sou a coisa mais verdadeira que você jamais vai conhecer.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A diferença

Eu sentada no vão da porta.
Os cabelos presos em um coque mal feito.
As unhas lascadas, o esmalte roído.
A camisola molhada, de lágrimas e das vezes que assoei meu nariz nela.
A maquiagem (suave, como você gosta) borrada.
Os olhos inchados de tanto chorar.

Olho para o relógio.
Você disse que já estaria nos meus braços há três horas.
Três horas, meu amor. Não estou exagerando. Você falou.

Imagino o que você está fazendo.
Se ri, se bebe, se flerta, se dança. E eu choro. E choro mais só de imaginar.

Eu sentada no vão da porta, espero você chegar. Odeio você. Odeio o que você faz comigo. Odeio o que me faz sentir.
Mas me odeio mais ainda por permitir.

Qual é, afinal, a diferença entre nós dois?

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Atropelado de tênis novo, na esquina de casa

Atropelado de tênis novo, na esquina de casa.

Com seus fones de ouvindo disparando decibéis em sua cabeça, não ouviu o carro que fazia a curva; tampouco ouviu a inútil freada do mesmo carro; tampouco ouviu o baque seco de sua cabeça no asfalto. Não ouviu o grito do motorista, a revolta dos transeuntes, a sirene da ambulância ou o choro da família.
O fato é que a última coisa que pensou foi que desejava não ter comprado de couro.

manifesto prodrômico do mínimo aceitável

Saboreie aquele momento precioso em que você percebe que nunca poderá procurar do lado de lá.
Que quem-quer-que-seja-perfeito-para-você estará do lado de cá da cerca da loucura. Terá que ser insano; no mínimo, tão insano quanto você.

Para mim, terá não apenas que ter asas, mas tê-las soltas e arredias. Olhos abertos, orelhas em pé. Um sorriso que não se sabe se ameaçador ou simpático.
Eu amo cães de caça, aves de rapina e predadores extintos. E amo que me mordam. Amo também que saiam de casa e se demorem; que cheguem no outro dia, com um enorme osso entre os dentes e os olhos brilhando de orgulho.

Quero que me cantem canções desafinadas por opção. Quero quadros desalinhados com capricho; espelhos embaçados, cores conflitantes, aromas insuspeitos - maquiagem borrada antes mesmo de dormir. Quero um "boa noite" ao acordar e um "cale a boca" no silêncio. O paradoxo é o que faz todo o resto parecer normal. O patológico é o que cura o saudável, ou pelo menos o faz pensar-se curado.

Mas é na loucura que reside o inesperado. O criativo. O inexplicavelmente apaixonante.
É nas gotas homeopáticas de delírio e alucinação que reside a chave para um dia novo a cada novo dia. E que seja "bom dia" na hora de dormir! Se todo pensamento é interpretação, e toda interpretação foge aos sentidos, então proponho que pensamento é delirio, e que quanto mais longe deliro, mais longe penso. Nunca escondi, me pretendo um pensador. Delirante.

Minha dose minimamente aceitável de insanidade é aquela que em mim reside. Qualquer um abaixo disso, posso carimbá-lo como alguém que não sabe criar e que, justamente por isso, não sabe viver.

Eu sou precisamente o mínimo que exijo de você.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

transcender (2)

Eu sempre soube
Que eu era o trampolim
E tu eras a piscina.

Achei que eu fosse
Meio de transporte;
Achei que eu fosse
Até esporte olímpico
Mas eu era diversão.

A piscina sempre cheia,
De água e de amigos
E quando esvazia
(de um ou de outro),
Sempre enche de novo.

E assim tu, que nem pretendias,
Era o centro do meu mundo.
Era um motivo pra eu existir.

Mas trampolim sem piscina
Tem sentido limitado;
Não existe.
Resiste.

Piscina sem trampolim
Não é deixada de lado
Não deixa niguém triste.
Persiste.