quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

E o fim.

Acabei de me descompletar.

Agora já me desfiz em forma de mim mesmo: em palavras mal-escritas, com letras tortas e frases sem sentido.
Posso mirar, com meus próprios olhos, eu mesmo, na minha frente, olhando para mim.

É talvez menos agoniante que seja menos agonizante; que seja uma escolha, não uma morte; que seja um ponto final, e não uma palavra não terminada...

Então.
Acabou. Ganhei. Perdi. Mas acabou.

circunstancial

E não é de uma sequência de acasos que se faz o maior milagre e a maior desgraça?

Afinal, o que na vida não é circunstancial?

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

mala

E na mala de coisas
Que eu trouxe da tua casa
Vieram tu e eu.

Vieram nós dois, vestidos de passado;
Um leve cheiro de mofado.
Quando olho para lá,
Não me sinto acordar:
Sinto recordar.
(não estou sonhando
- eu ainda ando)

Aromas, cores, sons;
Uma confusa sensação
Que fez seu sentido,
Mas que ficou perdido
Em algum outro malão...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

perda

Eu o encorajo a tomar qualquer partido, a fazer qualquer movimento ou a criar qualquer coisa.
A parcimônia, o tédio e a tranquilidade não serão companheiros mais adequados que o serão as agitações e os movimentos de uma vida cheia de mudanças imprevisíveis.

A imprevisibilidade do mundo e a impossibilidade de controlar ele (e nós mesmos), aliás, é que tornam as coisas mais divertidas, desatrosas, geniais, milagrosas e potencialmente devastadoras. Não que todos esses adjetivos não digam a mesma coisa...

Se é pra ser - e eu tenho a pretensão de ser - eu quero ser desastroso e desastrado, genial e genioso, milagroso e miraculoso, potencialmente devastador e potencialmente devastado.
Tão simples
tão simples
tão simples
tão tão tão simples
.
não complique.

Visions of Johanna

"Louise she's all right
She's just near
She's delicate and seems like the mirror.
But she just makes it all too concise and too clear
That Johanna's not here"


Cada vez que vejo teus olhos castanhos
Não consigo não lembrar
Quão verdes eram os dela.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

eu tinha perdido mas achei

Eu gosto de vento no rosto
Mas o vento
Sempre bagunça meu cabelo.

Ainda assim, sempre que eu entro no ônibus, procuro um lugar que seja junto à janela, para ali fechar meus olhos e pensar. Ou não-pensar, deixar de ser.

Eu não entendo gente que fecha a janela, como se ficar com o cabelo bagunçado fosse ofender algum tipo de ordem social.

Eu gosto de vento no rosto
E o vento
Sempre bagunça meu cabelo.
Eu deixo ele bater
Rebater
Deixo mexer
Remexer
O meu cabelo.

Vem soprar o meu rosto?

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

compliquei

Mais de meia hora no telefone. Ela marchava pela sala, estendendo o cabo do telefone até quase soltar da tomada. Ela já está com dor de ouvido, por apertar o fone forte contra a cabeça: do outro lado da linha, ele fala muito baixo.
- E, sabe... depois que eu te conheci, eu penso em ti todos os dias. Sério, a minha vida mudou.
"Ah é? A minha continuou a mesma" ela pensou com frieza; disse apenas:
- Ah é? Mas sei lá, tu tem que continuar com a tua vida né... Tem que sair com pessoas legais e tal.
- Só que é tu que eu quero. Eu não quero mais ninguém agora; eu quero sair contigo!
Ela agora andava pela cozinha, enrolando o fio do telefone no dedo. Olhou para o forno. Sua pizza estava pronta (e esfriando) há uns bons quinze minutos, e ela ali, presa no telefone, ouvindo aquela ladainha.

(Ele era amigo do irmão mais velho dela. Conheceram-se por acaso, um dia, quando ele havia ido com "o pessoal" buscar o irmão - o Guto. Aliás, o Guto havia adorado quando descobrira que eles tinham ficado em uma festa, umas duas semanas depois. "Minha irmã e meu melhor amigo!" ele dissera para ela, na manhã seguinte à festa. Ela esperara uma reação furiosa, mas ele simplesmente sorriu tolamente por uns cinco segundos e abraçou-a... "Sabe, eu não casei com ele nem nada" ela falara. Ele simplesmente a olhou com carinho, ignorando o que quer que ela tivesse querido dizer. "Guto, eu..." mas ele a abraçou ainda mais forte, silenciando-a.)

- Alô? Tu ainda tá aí? Alô?
- Sim, sim, sim. Fala, pode falar - ela se distraíra por um momento, contando quantos ímãs de pizzarias diferentes tinha na geladeira... - quarta? Tá, quarta tá ótimo. É. Sim, sim, eu saio do cursinho às seis...
Desligou o telefone. Tirou sua pizza do forno. Colocou-a na mesa. Ainda estava cortando-a quando começou a pensar em uma boa doença para contrair até quarta-feira.

domingo, 5 de dezembro de 2010

primeira vez

Barrado da própria festa,
O menino ainda testa
A última camisinha que resta.

Era pra ser a primeira vez
Mas toda aquela nudez
Havia deixado-o tão tímido
E do tamanho do seu dedinho mínimo...

Agora ela veste o sutiã
"A gente tenta de novo amanhã"
Ela sai.
Se vai.
Ele fica sentado.
Pelado.

(E o mundo, só de gozação,
Dá-lhe, enfim, uma ereção)

sábado, 4 de dezembro de 2010

arte

Começa algo.
Assim, com o pincel ou a caneta na mão.
Com a flauta na boca, o pedal da guitarra no pé.
Com a fantasia, com a máscara, a maquiagem.
Com a máquina fotográfica, a filmadora ou a tela.
Na parede, no muro.
Começa algo em mim.
- opera tua arte em tudo que de ti se aproximar.
Quero que tu me agradeça por te poupar de todas as coisas ruins que eu tô pensando. Não que tu mereça.

pólo

Às vezes eu criaria um monte de dor
Só pra ter o prazer
De poder jogar em ti.

Às vezes eu criaria um país
Só pra não deixar
Entrar gente como tu.

Às vezes eu me escondo atrás de palavras-ações-gestos-e-olhares
Pra fingir que nada dói.
Mas tudo dói.
Tu me dói.
E não é só às vezes.