sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

a minha canção. o meu garoto. e um fim.

Ouvi uma história que não deviam me contar.
A história de um garoto que se afogou no mar.
Não caiu por acaso, decidiu se atirar.

"O garoto um dia nasceu. Um dia em uma família. Em uma família, em um lugar. O dia, a família e o lugar não importam: poderiam ser os seus.
O garoto, ainda bem jovem, se desapontou com sua família; buscou então amigos, vizinhos e colegas. Os amigos, vizinhos e colegas foram o bastante para si durante algum tempo, mas ele logo viu que não lhe satisfaziam completamente: um pouco menos jovem, o garoto passou a se apaixonar. Apaixonava-se como que por vício. Enamorava-se a cada pouco e, a cada pouco, cansava e mudava tudo.
Durante anos, o homem (pois ele já era um garoto de meia-idade) apaixonava-se, desapaixonava-se e reapaixonava-se como remédio para a paixão anterior... Apaixonava-se por pessoas, por ideias, por lugares, filmes e canções. Mas era tudo passageiro. Efêmero.

Já velho, muito velho, o garoto decidiu desistir de suas paixões. Mudou-se para uma praia isolada de tudo e de todos. Apenas ele, seu modesto chalé na encosta do morro e aquela imensidão de água salgada, que chocava-se nas pedras do morro.
Passou a escrever. Poesias, contos, livros inteiros. Durante horas, escrevia sobre si, sobre os outros. Sobre quase tudo e (por isso mesmo) sobre muito pouco. Lia aquilo que escrevia e sentia-se um pouco melhor. Mas ainda achava tudo muito morno, sem vida. Olhava ao redor, fitando sua praia, a cinzenta areia a colorir com tons melancólicos sua mente... Escreveu uma canção.

O garoto, dentro do velho, deu ao mundo seu mais triste som. Nos acordes, nas palavras, no tom de sua voz. Satisfez-se. Percebeu que era aquilo que devia ter feito anos antes. Percebeu que todos os degraus de sua ridícula existência culminavam naquelas palavras - e que, por um lance do destino, só o horizonte ouviria.
Assim, durante semanas, cantou para o oceano. O mar, como que aplaudindo, batia violentamente nas rochas, espumando e ecoando pela praia. O velho garoto sorria um sorriso enrugado para o mar. Um dia, subiu na pedra mais alta do morro, onde o vento rugia assustadoramente - ele não temia. Cantou o último verso de sua canção e..."

2 comentários:

  1. "...E na última palavra de sua canção, lembrou-se de uma ex-namorada, uma ruiva, linda. Lembrou-se dos gestos que ela costumava fazer, as coisas que ela gostava, as músicas que ela ouvia e de todos os momentos - poucos, ms ótimos - que esteve com ela. Aquela garota o fazia sentir-se bem, confortável, seguro. Mas aquela tinha sido só mais uma de suas paixões passageiras. Mas de alguma forma, foi impotante o bastante para ser lembrada antes de..."

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