- Essa porta sempre tranca, tem que dar uma puxadinha pra cima... - ela disse, fazendo força na maçaneta para cima.
- Peraí, deixa eu tentar - ele a entregou as sacolas que segurava, tomou a chave e, gentilmente, abriu a porta.
- Olha só! Como eu vivi tanto tempo sem ti? - ela riu suavemente, com um toque de malícia. - Ah, entra aí.
Ele entrou no apartamento. Parecia uma criança dentro de uma loja de brinquedos grande demais para sua atenção.
- Bah, Hitchcock na sala! Genial! - ele apontava para o cartaz de "Os Pássaros". Ela sorriu orgulhosa. Deu-lhe um beijinho e foi correndo guardar as compras.
- Tu comprou a vodka mesmo! Achei que fosse brincadeira! - ela gritou da cozinha. Ele sentara no sofá da sala e agora lia distraidamente uma revista qualquer que estava a seu alcance.
Logo, ela veio com o DVD que eles haviam alugado e um saco de pipoca.
- Preparado? - ela perguntou alguns instantes depois, já com o controle remoto na mão. Ele assentiu, e eles passaram duas horas aninhados um no outro (exceto por duas pausas para ela ir ao banheiro), assistindo a um dos clássicos aos quais ela sempre se referia.
Após o filme, recolheram minuciosamente as migalhas de pipoca do sofá e se dirigiram ao quarto dela. Ela pulou na cama e, pelo seu olhar, convidava-o a fazer o mesmo. Ele correu e se atirou do lado dela:
- E aí, gostou? - ela perguntou, abraçando o pescoço do rapaz.
- Gostei, gostei - respondeu, distraidamente, já beijando o pescoço dela.
Enroscaram-se, e iam beijando-se e abraçando-se, até que ele, num ato distraído, olhou para a estante que havia na cabeceira da cama. Ali, um ursinho de pelúcia o encarava com desprezo. Era branco, mas um pouco desbotado e encardido. Tinha um coração enorme e bobo na barriga e segurava sobre a cabeça um porta-retrato - vazio. O rapaz sentiu-se mal por um instante. Parou de beijá-la. Ela percebeu:
- Que que foi?
Ele apontou o ursinho com o queixo:
- Tirou a foto daí hoje, né?
Ela silenciou por um instante. Baixou o rosto e os olhos e suspirou. Levantando as sobrancelhas, disse então:
- Pelo menos eu tirei, né? - e sorriu minimamente.
Ele fez cara de quem entendeu a ideia. Respirou duas ou três vezes. Olhou para ela. Para o fundo dos olhos ela. Abriu um meio-sorriso e, num golpe só, deu um tapa no urso que o fez decolar até a lixeira, do outro lado do quarto. Piscou para a garota. Inicialmente assustada, ela deu uma gargalhada e se agarrou de novo no pescoço dele.
Já no outro dia, de manhã:
- Ele era horrível mesmo, não?
Ela concordou com a cabeça, mas não com a mente.
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
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